sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Fazer sala

Receber a alguém esmeradamente, com cortesias e atenções, não o deixando sozinho. É expressão antiga, já usada na "Crônica de Dom Fernando", de Fernão Lopes, onde se lê: "Convidou-me el-rei D. Fernando o conde e todos os capitães que com ele vinham, e a rainha, a condessa e as donas e donzelas de sua companhia; e este convite foi nos paços de el-rei, do Castelo, onde a todos foi feita sala mui honradamente."

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Cão que ladra não morde

Esta locução se aplica aos indivíduos que, enraivecidos, soltam torrentes de injúrias e de ameaças, mas depois se acalmam e não cumprem os sinistros desígnios iradamente anunciados. O mesmo provérbio existe em inglês, porém mais cauteloso: Barking dogs seldom bite (Cães que ladram raramente mordem). É também corrente na Inglaterra este provérbio: Dumb dogs are dangerous (Cães que não ladram são perigosos). Em latim: Canis mordens non latrat.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Pôr a boca no mundo

Queixar-se, fazer acusações, lamentar-se, desabafar, revelar segredos. Falando de Campos Sales, que, como Presidente da República, subvencionara jornais, Rui assim usa a locução: "O honrado brasileiro quis expurgar-se  para a eternidade, desinçando a consciência em ato público, do pulguedo, que o mordera na consciência, que o esmordaçava na reputação, e ainda o estaria mordicando nos escrúpulos. Quis, e fez. Pôs a boca no mundo e confessou, a medo, nas confidências do testamento, o que, durante a vertigem da sua possança, mandara desmentir com indignação e desabrimento." A passagem consta da conferência "A Imprensa e o Dever da Verdade."

Nota:
Expurgar: 1. Limpar, corrigir, sanear. 2. Livrar do que é prejudicial, nocivo: expurgar a sociedade dos seus maus elementos.
Desinçar: 1. Livrar de coisas ou pessoas nocivas. 2. Desinfestar.
Pulguedo: 1. Grande número de pulgas. 2. Lugar onde há muitas pulgas.
Esmordaçar: 1. Morder repetidas vezes.
Mordicar: o mesmo que mordiscar. 1. Dar pequenas e repetidas dentadas. 2. Morder ligeiramente.
Possar: 1. O mesmo que poder. 2. Entrar na posse.
Desabrimento: 1. Procedimento áspero ou grosseiro. 2. Rudeza.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Quando as galinhas tiverem dentes

O mesmo que no dia de São Nunca. Condição que jamais será cumprida. Expressão corrente tanto em Portugal como no Brasil. Exemplo colhido no conto "Pequeno Drama na Aldeia", do livro "Aves Migradoras", de Fialho de Almeida: "Apenas um noivo a merecia bem, Carlinhos. Esse, opinavam as terras circunvizinhas, quando as galinhas tiverem dentes." No Norte do Brasil diz-se de preferência criarem dentes. A mesma expressão é também usada na França. Brito Broca, em artigo no "Correio da Manhã", citou, para comprová-lo, uma quadra satírica sobre os romances, considerados ilegíveis, do escritor Paul Adam: "Nous lirons ces beaux romans. De notre ami Paul Adam. Quand les poules, quand les poules. Quand les poules aurons des dents" (Leremos os belos romances do nosso amigo Paul Adam, quando as galinhas, quando as galinhas, quando as galinhas tiverem dentes).

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Deus é grande, mas o mato é maior

Velho provérbio que tem curso principalmente no Nordeste do Brasil, em zonas assoladas pelo banditismo e onde há mais garantias para os que se escondem no mato do que para os ficam em suas casas, à mercê dos bandos facinorosos. A confiar apenas em Deus, os caboclos, ameaçados, preferem invocar a proteção divina em um esconderijo que lhes parece seguro. O Visconde de Taunay, nas suas "Memórias", mostra que esse dito já circulava no tempo da guerra contra Lopez: "Deviam as forças expedicionárias receber em Uberaba importante contingente da guarda nacional, convocada pelo presidente de Minas Gerais, naquele ponto central. parece que chegaram a reunir-se  cento e vinte, se não mais, cidadãos, dispostos, na aparência, a arrostar todas as peripécias da guerra e só pelo fato da apresentação eram considerados outros tantos heróis, já imortais, pelo jornalismo mineiro. À medida, porém, que íamos nos aproximando do núcleo de convocação, as deserções se acentuavam do modo mais significativo, pondo cada qual em prática o rifão muito em voga, naqueles tempos da campanha do Paraguai: Deus é grande, mas o mato ainda maior!" Locução aproximada: Fia-te na Virgem e não corras!

Nota:
Arrostar: 1. Encarar sem medo. 2. Fazer face a. 3. Enfrentar. 4. Afrontar.


domingo, 25 de setembro de 2011

A voz do dono

Expressão proverbial de origem inglesa, His master's voice, que se transformou, nos últimos anos, em slogan de uma marca de discos e fonógrafos. Sua origem está numa historieta narrada por William Winstanley no livro "England's Worthies", publicado em 1960. Segundo essa história, a segunda esposa de Sir Thomas More (canonizado como São Tómas Morus) recebera de presente um cãozinho, que uma pessoa amiga recolhera, por supô-lo extraviado. Um dia, apresentou-se em sua casa um mendigo, que se dizia dono do animal. Disposto a fazer justiça, Sir Thomas colocou sua esposa num dos lados do salão e o mendigo no outro, levando o cãozinho para o centro e dando, então, o sinal para que Lady More e o reclamante o chamassem ao mesmo tempo. Sem nenhuma indecisão, o cachorrinho atendeu ao chamado do mendigo: identificara a voz do dono. A sentença foi minorada ante a tristeza de Lady More. O mendigo levou, não o bicho, mas uma moeda de ouro, a título de indenização. Assim, ambas as partes ficaram satisfeitas com o estranho processo de descobrir a verdade.

Nota:

Fonógrafos: Aparelho que reproduz sons gravados em discos; gramofone.

sábado, 24 de setembro de 2011

O olho do dono engorda o cavalo

O sentido deste provérbio é o de que, sem a fiscalização direta do dono, nada pode correr bem numa propriedade, ou negócio. É contando com essa fiscalização que os empregados cumprem melhor seus deveres, e o moço da estrebaria não deixa de dar comida ao cavalo, ou de levá-lo ao pasto. Existe em francês: L'oeil du maítre engraisse le cheval. Aliás, "O Olho do Dono" é o título de uma fábula de La Fontaine, de que parece vir do provérbio, e que diz: Il n'est pour voir que l'oeil du maítre (Para ver não há como o olho do dono). A forma latina é: Oculus domini saginat equum.

domingo, 11 de setembro de 2011

Meter a mão na cumbuca

É expor-se a um risco sem nenhum resultado prático e antes com prejuízo certo. Vem a expressão de uma armadilha para apanhar macacos, que consiste em introduzir uma espiga de milho verde numa cumbuca feita de cabaça seca, em cuja abertura só pode passar em sentido vertical. A cumbuca é amarrada numa árvore frequentada por macacos. Quando um destes mete a mão na cumbuca e segura a espiga, fica preso. Como não raciocina, não solta a espiga, a fim de retirar a mão e fugir. Vem daí o provérbio: Macaco velho não mete a mão em cumbuca, ou seja, quem tem experiência da vida não comete imprudências.

sábado, 10 de setembro de 2011

Entornar o caldo

Complicar as coisas, estragar uma situação com um ato desastrado ou intempestivo. Antigamente, dizia-se entornar o carro, ou seja, virar o carro, como mostram estes versos do poeta português Sá de Miranda: "Quem nunca ouviu um rifão, mais corrente e mais usado, que é darem todos de mão, quantos vêm e quantos vão, ao carro que está entornado". João Ribeiro mostra que a aproximação entre caldo e carro veio de outro modismo peninsular, mexer o caldo. Deturpações desse gênero são muito frequentes. Rui Brabosa, usando a expressão num discurso parlamentar, assim fala dos boateiros e difamadores: "Nas horas caniculares  das grandes crises, quando a consciência popular se dilata na receptividade das grandes sedes, passam eles timbaleando o trem de vivandeira, com a tigela de sopas de alho para cada aberração do paladar. Mas, a um piparote da verdade, há de entornar-se-lhes o caldo". (12-01-1892).

Nota


Caniculares: quentes.
Vivandeira: mulher que vende ou leva mantimentos, seguindo tropas em marcha.
Piparote: peteleco.


sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Gastar a saliva

Falar demais, para tentar convencer alguém. Os "Subsídios para um vocabulário da gíria militar", edição da Biblioteca do Exército, consignam (registram) a expressão salivar, no sentido de conseguir algo através de conversa, ou, melhor, tentar conseguir algo através de conversa. Em francês usa-se a expressão: Dépenser sa salive ou user sa salive no sentido de falar muito. Maurice rat oferece como exemplo uma frase de Léon Henrique: Hulin dépensait sa salive dans les réunions publiques (Hulin gastava sua saliva nas reuniões públicas). Em espanhol diz-se: Gastar saliva en balde, isto é, em vão, falando inutilmente.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Carcamano

Denominação pejorativa dada aos imigrantes italianos, em razão das fraudes, atribuídas a estes, em suas quitandas e açougues, ao pesarem os alimentos, vendidos a quilo, "ajudando" a concha da balança a descer com o impulso da mão. De calcar a mão teria surgido a forma italianizada de carcamano, corrente não só no Brasil como na Argentina, onde Juan Bautista Alberdi a usou, num dos seus livros, em que dizia serem reverenciados, nos altares argentinos, alguns santos carcamanos, já ricos e portanto poderosos. Mas, além dessa acepção, Amadeu Amaral registrou, no seu "Dialeto caipira": "Existe, ou existiu, esse termo na costa da Galícia, sob a forma de carcaman, servindo para designar os contrabandistas; tem, ainda, a significação de navio grande, mau e pesado".

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Pagar o pato

Fazer o papel de tolo, pagar para que os outros aproveitem, arcar com as responsabilidades de despesas alheias, ser ludibriado e, às vezes, com afronta grave. Autores renascentistas portugueses, como Sá Miranda, já usavam a expressão, em seus versos, como demonstra João Ribeiro. O autor das "Frases Feitas" resume, a propósito, um conto licencioso escrito em latim pelo autor florentino Giovanni Francesco Poggio Bracciolini, segundo o qual uma mulher concordara em adquirir, a um vendedor de patos, uma dessas aves, mediante a condição que ele estabelecera: a de conceder-lhe os seus favores. Cumprida a condição, teria aparecido o marido, reclamando o vendedor cinicamente o preço do pato e dizendo que ainda não estava pago. O marido acede (concorda) em pagar o pato em dinheiro, dizendo que abreviava a disputa para não atrasar a ceia. João Ribeiro afirma com  razão que esse conto florentino basta à explicação autêntica do ditado.

sábado, 3 de setembro de 2011

Façamos a revolução, antes que o povo a faça

Frase de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, que governava Minas Gerais, por ocasião da campanha da Aliança Liberal, da qual resultaria a revolução brasileira de 1930. Na verdade, essa frase era uma adaptação sintética e inteligente de um conselho de Rivarol: Lorsqu'on veut empêcher les horreurs d'une révolution, il faut la vouloir et la faire soi-même. (Quando se pretende evitar os horrores de uma revolução, é preciso querer fazê-la diretamente). Ele reprovava a conduta de Luís XVI, que, a seu ver, devia ter feito a revolução, com o povo, contra a nobreza, mas preferiu ficar com a nobreza, contra o povo, perdendo a si mesmo a aos aristocratas.

Nota


Rivarol: Antonie de Rivarol nasceu em Bagnols-sur-Cèze, Gard. Escritor francês, foi o jornalista mais importante, comentarista e epigramático entre essa facção de aristocratas que foi mais intransigente reacionário. Ele desdenhava o republicanismo e defendia o antigo regime.

Epigrama: 1. Antigamente, qualquer composição poética de curtas dimensões. 2. Pequena composição poética, que termina por um pensamento engenhoso ou satírico. 3. Sátira, dito mordaz, referência crítica. 4. (Lat. epigramma)

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

A bom entendedor, meia palavra basta

Encerra a ideia de que as pessoas perspicazes apreendem em seu sentido exato as mais leves alusões, principalmente quando contêm advertências e ameaças de revide. Existe na Espanha provérbio parecido: A buen entendedor, breve hablador. Aparece no texto da famosa comédia "La Celestina", de Fernando Rojas, e no capítulo XXXVII do imortal "Dom Quixote", de Cervates. É corrente também na França: À bon entendeur, demi mot.