segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Macaco não olha para seu rabo

Essa locução é a moralidade de uma história de bichos, na qual um macaco faz observações jocosas sobre a cotia, que não tem rabo, sem se lembrar de que os outros animais o viam com igual estranheza, em razão da excessiva extensão de sua cauda. Significa que vemos mais facilmente os defeitos alheios do que os nossos. Provérbio aproximado: Corcunda não vê a sua corcova, mas vê a do seu vizinho. Há com o mesmo sentido uma fábula de Fedro, "De Vitiis Hominum", sobre os vícios dos homens, a qual diz que Júpiter pôs sobre nós dois alforjes, um às costas, carregado com nossos defeitos, outro à frente, carregado dos defeitos alheios. Por essa razão, não podemos ver nossos vícios e deficiências, mas vemos logo os dos outros, de quem nos tornamos os mais severos censores.

Nota


Jocoso: 1. Alegre, gracioso. 2. Que provoca o riso.
Alforje: 1. Saco fechado em ambas as extremidades e com uma abertura no centro, de modo que forma como que duas bolsas. Usa-se ao ombro, para distribuir o peso dos dois lados.


sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Fazer sala

Receber a alguém esmeradamente, com cortesias e atenções, não o deixando sozinho. É expressão antiga, já usada na "Crônica de Dom Fernando", de Fernão Lopes, onde se lê: "Convidou-me el-rei D. Fernando o conde e todos os capitães que com ele vinham, e a rainha, a condessa e as donas e donzelas de sua companhia; e este convite foi nos paços de el-rei, do Castelo, onde a todos foi feita sala mui honradamente."

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Cão que ladra não morde

Esta locução se aplica aos indivíduos que, enraivecidos, soltam torrentes de injúrias e de ameaças, mas depois se acalmam e não cumprem os sinistros desígnios iradamente anunciados. O mesmo provérbio existe em inglês, porém mais cauteloso: Barking dogs seldom bite (Cães que ladram raramente mordem). É também corrente na Inglaterra este provérbio: Dumb dogs are dangerous (Cães que não ladram são perigosos). Em latim: Canis mordens non latrat.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Pôr a boca no mundo

Queixar-se, fazer acusações, lamentar-se, desabafar, revelar segredos. Falando de Campos Sales, que, como Presidente da República, subvencionara jornais, Rui assim usa a locução: "O honrado brasileiro quis expurgar-se  para a eternidade, desinçando a consciência em ato público, do pulguedo, que o mordera na consciência, que o esmordaçava na reputação, e ainda o estaria mordicando nos escrúpulos. Quis, e fez. Pôs a boca no mundo e confessou, a medo, nas confidências do testamento, o que, durante a vertigem da sua possança, mandara desmentir com indignação e desabrimento." A passagem consta da conferência "A Imprensa e o Dever da Verdade."

Nota:
Expurgar: 1. Limpar, corrigir, sanear. 2. Livrar do que é prejudicial, nocivo: expurgar a sociedade dos seus maus elementos.
Desinçar: 1. Livrar de coisas ou pessoas nocivas. 2. Desinfestar.
Pulguedo: 1. Grande número de pulgas. 2. Lugar onde há muitas pulgas.
Esmordaçar: 1. Morder repetidas vezes.
Mordicar: o mesmo que mordiscar. 1. Dar pequenas e repetidas dentadas. 2. Morder ligeiramente.
Possar: 1. O mesmo que poder. 2. Entrar na posse.
Desabrimento: 1. Procedimento áspero ou grosseiro. 2. Rudeza.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Quando as galinhas tiverem dentes

O mesmo que no dia de São Nunca. Condição que jamais será cumprida. Expressão corrente tanto em Portugal como no Brasil. Exemplo colhido no conto "Pequeno Drama na Aldeia", do livro "Aves Migradoras", de Fialho de Almeida: "Apenas um noivo a merecia bem, Carlinhos. Esse, opinavam as terras circunvizinhas, quando as galinhas tiverem dentes." No Norte do Brasil diz-se de preferência criarem dentes. A mesma expressão é também usada na França. Brito Broca, em artigo no "Correio da Manhã", citou, para comprová-lo, uma quadra satírica sobre os romances, considerados ilegíveis, do escritor Paul Adam: "Nous lirons ces beaux romans. De notre ami Paul Adam. Quand les poules, quand les poules. Quand les poules aurons des dents" (Leremos os belos romances do nosso amigo Paul Adam, quando as galinhas, quando as galinhas, quando as galinhas tiverem dentes).

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Deus é grande, mas o mato é maior

Velho provérbio que tem curso principalmente no Nordeste do Brasil, em zonas assoladas pelo banditismo e onde há mais garantias para os que se escondem no mato do que para os ficam em suas casas, à mercê dos bandos facinorosos. A confiar apenas em Deus, os caboclos, ameaçados, preferem invocar a proteção divina em um esconderijo que lhes parece seguro. O Visconde de Taunay, nas suas "Memórias", mostra que esse dito já circulava no tempo da guerra contra Lopez: "Deviam as forças expedicionárias receber em Uberaba importante contingente da guarda nacional, convocada pelo presidente de Minas Gerais, naquele ponto central. parece que chegaram a reunir-se  cento e vinte, se não mais, cidadãos, dispostos, na aparência, a arrostar todas as peripécias da guerra e só pelo fato da apresentação eram considerados outros tantos heróis, já imortais, pelo jornalismo mineiro. À medida, porém, que íamos nos aproximando do núcleo de convocação, as deserções se acentuavam do modo mais significativo, pondo cada qual em prática o rifão muito em voga, naqueles tempos da campanha do Paraguai: Deus é grande, mas o mato ainda maior!" Locução aproximada: Fia-te na Virgem e não corras!

Nota:
Arrostar: 1. Encarar sem medo. 2. Fazer face a. 3. Enfrentar. 4. Afrontar.


domingo, 25 de setembro de 2011

A voz do dono

Expressão proverbial de origem inglesa, His master's voice, que se transformou, nos últimos anos, em slogan de uma marca de discos e fonógrafos. Sua origem está numa historieta narrada por William Winstanley no livro "England's Worthies", publicado em 1960. Segundo essa história, a segunda esposa de Sir Thomas More (canonizado como São Tómas Morus) recebera de presente um cãozinho, que uma pessoa amiga recolhera, por supô-lo extraviado. Um dia, apresentou-se em sua casa um mendigo, que se dizia dono do animal. Disposto a fazer justiça, Sir Thomas colocou sua esposa num dos lados do salão e o mendigo no outro, levando o cãozinho para o centro e dando, então, o sinal para que Lady More e o reclamante o chamassem ao mesmo tempo. Sem nenhuma indecisão, o cachorrinho atendeu ao chamado do mendigo: identificara a voz do dono. A sentença foi minorada ante a tristeza de Lady More. O mendigo levou, não o bicho, mas uma moeda de ouro, a título de indenização. Assim, ambas as partes ficaram satisfeitas com o estranho processo de descobrir a verdade.

Nota:

Fonógrafos: Aparelho que reproduz sons gravados em discos; gramofone.

sábado, 24 de setembro de 2011

O olho do dono engorda o cavalo

O sentido deste provérbio é o de que, sem a fiscalização direta do dono, nada pode correr bem numa propriedade, ou negócio. É contando com essa fiscalização que os empregados cumprem melhor seus deveres, e o moço da estrebaria não deixa de dar comida ao cavalo, ou de levá-lo ao pasto. Existe em francês: L'oeil du maítre engraisse le cheval. Aliás, "O Olho do Dono" é o título de uma fábula de La Fontaine, de que parece vir do provérbio, e que diz: Il n'est pour voir que l'oeil du maítre (Para ver não há como o olho do dono). A forma latina é: Oculus domini saginat equum.

domingo, 11 de setembro de 2011

Meter a mão na cumbuca

É expor-se a um risco sem nenhum resultado prático e antes com prejuízo certo. Vem a expressão de uma armadilha para apanhar macacos, que consiste em introduzir uma espiga de milho verde numa cumbuca feita de cabaça seca, em cuja abertura só pode passar em sentido vertical. A cumbuca é amarrada numa árvore frequentada por macacos. Quando um destes mete a mão na cumbuca e segura a espiga, fica preso. Como não raciocina, não solta a espiga, a fim de retirar a mão e fugir. Vem daí o provérbio: Macaco velho não mete a mão em cumbuca, ou seja, quem tem experiência da vida não comete imprudências.

sábado, 10 de setembro de 2011

Entornar o caldo

Complicar as coisas, estragar uma situação com um ato desastrado ou intempestivo. Antigamente, dizia-se entornar o carro, ou seja, virar o carro, como mostram estes versos do poeta português Sá de Miranda: "Quem nunca ouviu um rifão, mais corrente e mais usado, que é darem todos de mão, quantos vêm e quantos vão, ao carro que está entornado". João Ribeiro mostra que a aproximação entre caldo e carro veio de outro modismo peninsular, mexer o caldo. Deturpações desse gênero são muito frequentes. Rui Brabosa, usando a expressão num discurso parlamentar, assim fala dos boateiros e difamadores: "Nas horas caniculares  das grandes crises, quando a consciência popular se dilata na receptividade das grandes sedes, passam eles timbaleando o trem de vivandeira, com a tigela de sopas de alho para cada aberração do paladar. Mas, a um piparote da verdade, há de entornar-se-lhes o caldo". (12-01-1892).

Nota


Caniculares: quentes.
Vivandeira: mulher que vende ou leva mantimentos, seguindo tropas em marcha.
Piparote: peteleco.


sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Gastar a saliva

Falar demais, para tentar convencer alguém. Os "Subsídios para um vocabulário da gíria militar", edição da Biblioteca do Exército, consignam (registram) a expressão salivar, no sentido de conseguir algo através de conversa, ou, melhor, tentar conseguir algo através de conversa. Em francês usa-se a expressão: Dépenser sa salive ou user sa salive no sentido de falar muito. Maurice rat oferece como exemplo uma frase de Léon Henrique: Hulin dépensait sa salive dans les réunions publiques (Hulin gastava sua saliva nas reuniões públicas). Em espanhol diz-se: Gastar saliva en balde, isto é, em vão, falando inutilmente.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Carcamano

Denominação pejorativa dada aos imigrantes italianos, em razão das fraudes, atribuídas a estes, em suas quitandas e açougues, ao pesarem os alimentos, vendidos a quilo, "ajudando" a concha da balança a descer com o impulso da mão. De calcar a mão teria surgido a forma italianizada de carcamano, corrente não só no Brasil como na Argentina, onde Juan Bautista Alberdi a usou, num dos seus livros, em que dizia serem reverenciados, nos altares argentinos, alguns santos carcamanos, já ricos e portanto poderosos. Mas, além dessa acepção, Amadeu Amaral registrou, no seu "Dialeto caipira": "Existe, ou existiu, esse termo na costa da Galícia, sob a forma de carcaman, servindo para designar os contrabandistas; tem, ainda, a significação de navio grande, mau e pesado".

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Pagar o pato

Fazer o papel de tolo, pagar para que os outros aproveitem, arcar com as responsabilidades de despesas alheias, ser ludibriado e, às vezes, com afronta grave. Autores renascentistas portugueses, como Sá Miranda, já usavam a expressão, em seus versos, como demonstra João Ribeiro. O autor das "Frases Feitas" resume, a propósito, um conto licencioso escrito em latim pelo autor florentino Giovanni Francesco Poggio Bracciolini, segundo o qual uma mulher concordara em adquirir, a um vendedor de patos, uma dessas aves, mediante a condição que ele estabelecera: a de conceder-lhe os seus favores. Cumprida a condição, teria aparecido o marido, reclamando o vendedor cinicamente o preço do pato e dizendo que ainda não estava pago. O marido acede (concorda) em pagar o pato em dinheiro, dizendo que abreviava a disputa para não atrasar a ceia. João Ribeiro afirma com  razão que esse conto florentino basta à explicação autêntica do ditado.

sábado, 3 de setembro de 2011

Façamos a revolução, antes que o povo a faça

Frase de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, que governava Minas Gerais, por ocasião da campanha da Aliança Liberal, da qual resultaria a revolução brasileira de 1930. Na verdade, essa frase era uma adaptação sintética e inteligente de um conselho de Rivarol: Lorsqu'on veut empêcher les horreurs d'une révolution, il faut la vouloir et la faire soi-même. (Quando se pretende evitar os horrores de uma revolução, é preciso querer fazê-la diretamente). Ele reprovava a conduta de Luís XVI, que, a seu ver, devia ter feito a revolução, com o povo, contra a nobreza, mas preferiu ficar com a nobreza, contra o povo, perdendo a si mesmo a aos aristocratas.

Nota


Rivarol: Antonie de Rivarol nasceu em Bagnols-sur-Cèze, Gard. Escritor francês, foi o jornalista mais importante, comentarista e epigramático entre essa facção de aristocratas que foi mais intransigente reacionário. Ele desdenhava o republicanismo e defendia o antigo regime.

Epigrama: 1. Antigamente, qualquer composição poética de curtas dimensões. 2. Pequena composição poética, que termina por um pensamento engenhoso ou satírico. 3. Sátira, dito mordaz, referência crítica. 4. (Lat. epigramma)

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

A bom entendedor, meia palavra basta

Encerra a ideia de que as pessoas perspicazes apreendem em seu sentido exato as mais leves alusões, principalmente quando contêm advertências e ameaças de revide. Existe na Espanha provérbio parecido: A buen entendedor, breve hablador. Aparece no texto da famosa comédia "La Celestina", de Fernando Rojas, e no capítulo XXXVII do imortal "Dom Quixote", de Cervates. É corrente também na França: À bon entendeur, demi mot.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Devagar com o andor

É uma frase feita que significa o mesmo que nada de pressa ou vamos devagar. Nasceu, ao que se diz, das preocupações de um vigário, com o santo de sua igreja, ao sair este em procissão, num  andor levado aos ombros de homens muito apressados. Procurando moderar a marcha dos fieis e não achando melhor argumento, teria o padre gritado: Devagar com o andor, que o santo é de barro! A última parte da sentença ainda está em uso, mas é mais frequente a utilização apenas da primeira parte.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Nem tudo o que reluz é ouro

O sentido deste provérbio é semelhante ao de: As aparências enganam. O ouropel pode ter o brilho e a cor do ouro, mas brilho e cor falsos e sem o mesmo valor. Mário Lamenza registra esta forma: "Nem tudo o que luz é ouro; nem tudo que é feio é mau, quem não tem o que fazer, vá fazer colher de pau". Uma música carnavalesca carioca fez o Brasil inteiro cantar: Nem tudo o que reluz é ouro, nem tudo o que balança cai. É curioso assinalar que o último desses versos repete textualmente uma máxima de Montaigne, que diz: Tout ce qui branle ne tombe pas. Ela se encontra no livro III, capítulo nono, dos famosos "Ensaios", sob o título de "Da Vaidade".

Nota


Ouropel: 1. s.m. Lâmina de latão, fina e polida, que imita o ouro e de longe tem seu brilho. 2. Fig. Aparência enganosa; falso brilho.

sábado, 27 de agosto de 2011

Chover no molhado

Dizer coisa dita, ou redita. Fazer algo desnecessário, que nenhuma vantagem trará. Aconselhar, com insistência, medida já tomada. Em italiano se diz: Piovere sul bagnato. Há locuções aproximadas em outros idiomas. Em inglês: To carry coal to Newcastle (Carregar carvão para Newcastle, que é grande centro exportador desse produto). Em espanhol: Llevar hierro a Biscaya (Levar ferro a Biscaya, que é terra fértil em ferro). Em francês: Porter des feuilles au bois (Carregar folhas para a floresta). Em italiano: Vender il mieli a chi a le api (Vender o mel a quem tem as abelhas). E a própria locução portuguesa: Ensinar padre-nosso a vigário, ou ensinar a rezar a missa.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Dize-me com quem andas, dir-te-ei quem és

Este provérbio mostra que um homem pode ser julgado pelo conjunto de suas relações sociais ou de suas companhias. Variante: Dize-me com quem lidas, dir-te-ei as manhas que tens. Existe na França, nos mesmos termos: Dis-moi qui tu fréquentes, je te dirai qui tu es. Os ingleses têm dois provérbios com o mesmo sentido, embora com palavras diversas: A man is known by his friends (Conhece-se um homem pelos seus amigos) a Birds of a feather flock together (Pássaros da mesma plumagem voam juntos).

domingo, 7 de agosto de 2011

Zero à esquerda

Criatura insignificante, pessoa sem valor próprio, que nada acrescenta a uma instituição ou partido político. A locução se apoia num princípio básico de aritmética, e passou a ser usada devido a um divulgadíssimo conto do Abade Blanchet (escritor francês do século XVIII) intitulado "A Academia dos silenciosos". Nessa sábia instituição, que teria existido em Amadan, prevalecia a regra: "Os acadêmicos, pensarão muito, escreverão pouco e falarão e menos possível." Um dia, o Dr. Zeb, reconhecidamente o maior sábio da Pérsia, resolveu ser um de seus cem membros. Mas quando lá chegou a vaga já havia sido preenchida. Pesaroso, o presidente, querendo significar isso, sem dizer palavra, fez encher uma taça d'água até as bordas, mostrando-a ao candidato      retardatário . Sem desencorajar-se, o Dr. Zeb, encontrando à mão uma pétala de rosa, depositou-a na taça, sem que a água transbordasse. Diante de tão engenhosa resposta, bateram palmas todos os presentes e ele foi, assim, admitido, por aclamação. Como os estatutos tinham sido violados, o novo acadêmico ao tomar posse, escreveu modestamente, sem dizer palavra: "Não valereis mais nem menos." E acrescentou esta cifra: "0100". Com o mesmo laconismo, o presidente escreveu, em resposta: Valeremos onze vezes mais: 1100." Agrippino Grieco é autor de um livro de sátiras literárias intitulado "Zeros à esquerda".

Nota


Lacônico: Breve, conciso; dito ou escrito em poucas palavras.

sábado, 6 de agosto de 2011

O Brasil está à beira de um abismo

Chavão parlamentar e jornalístico, que remonta ao tempo do Império. Tanto dele abusou a oposição que acabou por se desmoralizar. Escrevendo sobre as tendências restauradoras de José Bonifácio que, em 1833, pretendia ver D. Pedro I novamente no trono do Brasil, o historiador Vieira Fazenda assinalou: "Os entusiastas de José Bonifácio dividem-se em dois campos: uns confessam que o ilustre ancião fora manifestamente restaurador; mas não levado por espírito de traição, e sim por julgar o país à beira de um abismo, prestes a desmembrar-se, perder sua grandeza e unidade". O artigo é de 26/04/1904, mas retrata as ideias do tempo de José Bonifácio. Está incorporado às "Antiqualhas e Memórias do Rio de Janeiro". Na comédia "O Diabo no Corpo", representada em 1905, Coelho Neto satirizava a expressão do personagem Libório, candidato a deputado: "Devo dizer-vos, antes de pleitear a minha causa, quais são as ideias do meu programa. Sou dos que pensam que a pátria está à beira dum abismo, dum báratro, dum vórtice. Urge dar-lhe mão forte".

Nota


Chavão: 1. Coisa que se diz ou escreve por costume, clichê.
Báratro: 1. Precipício onde se jogavam os criminosos em Atenas. 2. Abismo.
                   3. Inferno.
Vórtice: 1. Redemoinho que pode surgir numa corrente de água. 2. Furacão.
                   3. Turbilhão.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Alhos e bugalhos

Misturar alhos com bugalhos é tomar uma coisa por outra, fazer confusões. Há também a forma: falo-lhe em alhos, responde-me com bugalhos, consignada em vários adagiários e que significa: Pergunto-lhe uma coisa, responde outra. Há uma outra locução com o mesmo sentido: Confundir germano com gênero humano. João Guimarães Rosa apresenta uma extensão, no conto: "A simples e exata estória do burrinho do comandante": "O Sr. pode às vezes distinguir alhos de bugalhos, e tassalhos de borralhos e vergalhos de chanfalhos, e mangalhos... Mas, e o vice-versa?"

Nota


Borralho: cinzas ainda quente.
Bugalho: fruto redondo do carvalho e outras árvores do tamanho de uma noz. Mais conhecido por causa da expressão "Não confunda alhos com bugalhos", cuja semelhança está no tamanho e na forma da cabeça de alho.
Chanfalho: 1. espada velha e sem corte. 2. instrumento desafinado.
Mangalho: 1. s.m. chul. pênis grande. 2. produto da indústria doméstica e da pequena lavoura que se vende      
                  nos mercados e feiras do interior.
Tassalho: pedaço.
Vergalho: chicote, chibata.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Deus ajuda a quem se ajuda

Esse provérbio é de origem francesa e constitui a adaptação da moralidade de uma das fábulas de La Fontaine, "Le Chartier Embourbe". Aide-toi et le ciel t'aidera (Ajuda-te e o céu te ajudará). Com a forma aqui dicionarizada, serviu de divisa, em 1824, a uma sociedade política destinada a induzir a classe média a resistir ao governo. Essa sociedade, de que Guizot chegou a ser um dos presidentes e que teve os jornais "Le Globe" e "Le National" como seus orgãos, ajudou a promover a revolução de 1830 e foi dissolvida em 1832. Provérbios aproximados: Deus ajuda a quem cedo madruga; Deus ajuda a quem trabalha; Deus é bom trabalhador, mas gosta que o ajudem. (Curiosa é a forma anatonímica deste provérbio em hebraico: im eyn ani li mi li, e seu sentido: se eu não (for) por mim, quem (o será)?)

Nota


Anatonímica: estudo dos antônimos.

François Pierre Guillaume Guizot: Foi um político francês. Ocupou o cargo de primeiro ministro da França, entre 19 de setembro de 1847 a 23 de fevereiro de 1848. Guizot, ministro da Instrução Pública, determinou, em 1834, na Faculdade de Direito de Paris, a instalação da primeira cátedra de Direito Constitucional. Confiou-a a um professor italiano, Pellegrino Rossi, que publicou em seguida um curso de direito constitucional em vários volumes (Paris, 1866).



segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Entrar pelo cano

Ser mal sucedido num empreendimento qualquer, fracassar, fazer fiasco, dar com os burros nágua. O cano, no caso, é o cano do esgoto. Fernando Sabino, na crônica intitulada "Encontro de Preto e Branco" (Manchete, fevereiro de 1961), escreve sobre um indivíduo ameaçado de perder sua posição na empresa de um norte-americano: "Passar fome era muito bonito nos romances de Knut Hamsun, lidos depois do jantar, sem credores à porta, sem conta de pensão a pagar. Ia-se o emprego, a confiança que merecia, a segurança conquistada - entrava de novo pelo cano de mais negra necessidade, isso é que não!" Também se usa popularmente a expressão entrar bem para dizer: dar-se mal.

Nota


Knut Hamsun: nasceu em 1859 em Gudbrandsdalen, na região da Noruega. Seu primeiro livro de ficção, Den Gaadefulde (1877), surgiu sob o nome de Knut Petersen Hamsund - ele tinha 18 anos. Em 1878, Hamsun se mudou para a Christiania (agora Oslo), onde viveu na miséria (seu romance mais conhecido - Fome é ambientado nesta cidade).  Em 1884, depois de encontrar Mark Twain e escrever um artigo sobre ele, um erro de impressão comeu o "d" do final da Hamsund. Hamsun aceitou seu novo nome. Hamsun morreu em Norholm, no dia 19 de fevereiro de 1952.

OBS.: Sua história de vida foi muito interessante. Vale a pena ler um pouco sobre ele.



domingo, 31 de julho de 2011

Toda nação tem o governo que merece

Aforismo político enunciado pelo escritor direitista Conde Joseph Marie de Maistre, grande opositor da revolução Francesa, em que via "um caráter satânico". Consta de uma carta desse aristocrata e homem de letras francês, endereçada de São Petersburgo, onde exercia então o cargo de embaixador de Victor Emmanuel I junto ao governo czarista, a um amigo, nomeado apenas como o "cavaleiro de ..." e que consta do volume "Lettres et Opuscules Inédits", volume I. Tal frase tem sido muitas vezes falsamente atribuída a Voltaire, pessoa a quem Joseph de Maistre detestava, tendo dito dele que "se Paris o coroava, Sodoma o teria banido". A forma original é: Toute nation a le gouvernement qu'elle mérite.

Nota

Aforismo: Ditado, provérbio.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Uma das mãos lava a outra

Velho provérbio, que é também dito com esta forma: Uma das mãos lava a outra e ambas lavam o rosto. Adverte que, sem ajuda mútua, muitas coisas não poderão ser realizadas, ao passo que, se um indivíduo juntar seus esforços aos de outro, ambos se beneficiarão. O jurista e estadista austríaco, Joseph Unger, escreveu a respeito deste provérbio: Wie oft wascht nicht eine Hand die andere und beide bleiden schmützig (Muitas vezes uma das mãos não lava a outra e ambas se emporcalham). Morais, no seu dicionário, registra expressão semelhante: Faz-me a barba, far-te-ei o cabelo, dando esta definição: Farei um serviço por outro que me fizeres.  Os franceses têm locução proverbial aproximada: Un barbier rase l'autre (Um barabeiro escanhoa o outro), anterior, sem dúvida, ao uso generalizado da gilete. Em inglês, é corrente, com o mesmo sentido, este provérbio:  Scratch my back, and I'll scratch yours (Coça as minhas costas que eu coçarei as tuas).

Escanhoar: fazer a barba.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Parte do leão

Ficar com a parte do leão é ficar com tudo, é despojar os sócios com recursos ilícitos e intimidações. Nasce a expressão de uma fábula clássica, de que há versões em Esopo e Fedro e que foi renovada por La Fontaine. O leão convidara três outros animais para caçar (a bezerra, a cabra e a ovelha, na versão de La Fontaine), com a combinação de dividir depois os despojos. Graças ao esforço comum, um veado foi morto, sendo então repartido conforme o número de caçadores. O leão então falou, tomando para si a primeira peça: "Está é a minha, e a razão é que eu me chamo leão. Quanto a isso ninguém tem o que objetar. A segunda me cabe ainda por direito: o direito do mais forte. Como o mais valente, é que eu reclamo a terceira. A quarta se algum de vós a tocar, será estrangulado". Na versão de Esopo, os animais são apenas três. Morto o veado, o leão mata também o asno, dizendo à raposa que é para que eles fiquem com pedaços maiores. A raposa, finória, diz que não seria necessário, porque está com muito fastio. Come apenas uns bocados insignificantes e se vai, deixando tudo ao leão. Dessas fábulas é oriunda a expressão: Contrato Leonino.

Nota


Esopo: é um legendário autor grego, que teria vivido na antiguidade, ao qual se atribui a paternidade da fábula como gênero literário. Esopo teria sido um escravo, que foi libertado pelo seu dono, que ficou encantado com suas fábulas. As fábulas de Esopo serviram como base para recriações de outros escritores ao longo dos séculos como Fedro e La Fontaine.

Fedro: foi um fabulista romano nascido na Macedônia, Grécia, filho de escravos, provavelmente foi alforriado pelo imperador romano Augusto. Seu nome completo era Caio Júlio Fedro.

Jean de La Fontaine: foi um poeta e fabulista francês. Era filho de um inspetor de águas e florestas, e nasceu na pequena localidade de Château-Thierry. Estudou teologia e direito em Paris, mas seu maior interesse sempre foi a literatura.


Finória: sagaz, esperta.
Fastio: falta de apetite (neste contexto).




segunda-feira, 18 de julho de 2011

Não ter papas na língua

É o mesmo que falar franco, ou ser desbocado. A origem dessa locução é castelhana. Dizia-se, a princípio: No tiene pepitas en la lengua (Não tem prevides na língua). Segundo João Ribeiro, a palavra pepitas foi com o tempo adulterada, transformando-se em papitas, diminutivo de papas, donde a locução ter passado a significar: Não ter batatas na boca, ou ter a boca desimpedida. Na comédia de França Junior "Direito por Linhas Tortas", justifica-se Leonarda, personagem de palavra solta: "A minha linguagem sempre foi esta. O senhor sabe perfeitamente que eu nunca tive papas na língua. Além disso estou em minha casa, e posso dizer o que bem me parecer".

domingo, 17 de julho de 2011

À Bessa

O mesmo que abundantemente, com fartura, de maneira copiosa. A origem do dito é atribuída às qualidades de argumentador do jurista alagoano Gumercindo Bessa, advogado dos acreanos que não queriam que o território do Acre fosse incorporado ao Estado do Amazonas. Rui Barbosa, que se demitira do cargo de ministro plenipotenciário, quando da negociação do tratado de Petrópolis, por se opor às diretrizes de Rio Branco, aceitara a advogar a causa do Amazonas e chegara, inclusive, não só a propor ação judicial, mais ainda a apresentar ao Senado Federal projeto que mandava incorporar o Acre àquele estado. O advogado contrário, Gumercindo Bessa, apresentara argumentos tão esmagadores e tão numerosos em favor dos acreanos , que logo se tornou figura  respeitada nos meios forenses. Conta-se que certa vez um cidadão procurou o Presidente Rodrigues Alves para pleitear determinados favores e com tal eloquência expôs suas ideias que o ilustre estadista teria observado: "O senhor tem argumento à Bessa". Com o tempo, a maiúscula de Bessa desapareceu. Entre os autores que registram essa origem da popular expressão se destacam Rodrigues de Carvalho, na "Revista Nova", nº 6, de abril de 1932, e Aires da Mata Machado Filho, no livro "Escrever Certo", 1ª série.

Nota
Plenipotenciário: que tem plenos poderes.
Pleitear: 1. Defender, sustentar em discussão. 2. Participar de concurso. 3. Tentar conseguir alguma coisa por meio de argumento.

sábado, 16 de julho de 2011

Até debaixo d'água

Esta expressão, de início, significava até sob as condições mais adversas. Depois adquiriu outro sentido, passando também a significar com fartura, em número elevado, com grande abundância. Popularizou-se a partir de 1913, pois constituía a tradução da divisa da nossa flotilha de submarinos, adotada, em latim, no ano anterior: Usque ad sub acquam nauta sum, significava que aqueles homens eram marinheiros até debaixo d'água. Um homem bravo, valente, decidido, era a partir de então homem até debaixo d'água. Do mesmo modo, uma moça de muitos encantos era bonita até debaixo d'água. Foi empregada com o segundo sentido por Antônio de Alcântara Machado no conto "O Patriota Washington", que faz parte do livro "Laranja da China": "Amanhã não haverá mais leprosos no Brasil. Por enquanto ainda há, mas isso de ter morfeia não é privilégio brasileiro. Não pensem não. O mundo inteiro tem. A argentina então nem se fala. Morfético até debaixo d'água".

Nota:
Morfeia: Hanseníase.
Morfético: Que, o aquele que tem morfeia, hanseníase.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Roupa suja lava-se em casa

Este provérbio indica que as disputas entre membros de uma família devem ser solucionadas sem escândalo público e sem transcender os círculos familiares, de modo que os vizinhos ou estranhos não tomem conhecimento de seus segredos, dificuldades ou mal entendidos. É comum esse provérbio em língua inglesa com esta forma: Wash your dirty linen at home. E em língua francesa: Il faut laver le linge sale en famille. Seria este, aliás, um provérbio constantemente repetido por Napoleão Bonaparte a seus irmãos e irmãs. Balzac, em "Eugênia Grandet", atribui a invenção do dito a Napoleão, mas já vinha citado no volume VIII das "Memórias" de Casanova, como coisa comum no século XVIII.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Cada macaco no seu galho

É o mesmo que dizer: Cada homem na sua função, ou no ofício que lhe compete, ou para o qual está capacitado, sem interferir nas responsabilidades dos outros e sem perturbar o trabalho alheio. Os franceses dizem o mesmo, por outras palavras: Chacun à sa place (Cada qual em seu lugar) e: Chacun son métier (Cada qual em seu ofício). Outra forma proverbial francesa é: Chacun son mértier, les vaches seront bien gardées (Cada qual em seu ofício, as vacas serão bem guardadas, isto é, os pastores farão o que lhes compete). Os espanhóis têm estas: Bien está San Pedro em Roma e: Cada cual a su oficio. No fundo, tudo isso quer significar exatamente o mesmo que: Cada macaco no seu galho. Há outras locuções inglesas aproximadas, como, por exemplo: Every man to his station (Cada homem em seu lugar) e: Every man to his trade (Cada homem em sua profissão, ou negócio).

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Super-Homem

Palavra inventada pelo filósofo germânico Friedrich Wilhelm Nietzsche (1844-1900), para caracterizar um ser humano hipotético, capaz de altas conquistas morais e intelectuais. Ser que, segundo Nietzsche, poderia resultar de uma rigorosa seleção dos tipos normais existentes na Alemanha. A palavra alemã, übermensch, passou em tradução para as outras línguas. E em 1903, o dramaturgo inglês George Bernard Shaw contribui para popularizá-la em sua peça "Man and Superman" (Homem e Super-Homem). A popularidade do termo deu origem a várias outras combinações, entre as quais a mais comum, hoje, é a de super-bomba, para designar a bomba H. E deu origem, ainda, ao Superman, das histórias de quadrinhos, ou comic-strips, criado pelos desenhistas Jerry Siegel e Joe Shuster, a partir de 1938, no "Action Comics Magazine", nessas histórias, o repórter Clark Kent se transforma numa espécie de justiceiro ou de invencível homem de amanhã, intervindo nas situações perigosas, no último instante, como um deus. Com força sobre-humana, ele consegue ver e ouvir através das paredes, derrotando sempre os inimigos com seus músculos incomparáveis. Satirizando essa história, apareceu depois o Supermouse (super-camundongo), que é um ratinho invencível.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Tal pai, tal filho

Provérbio que tende a demonstrar que os filhos em geral reproduzem as qualidades e os defeitos paternos. É tão antigo que já aparece na estância XXVIII do terceiro canto de "Os Lusíadas", em que Camões procura demonstrar  que D. Afonso Henriques herdara as qualidades de bravura de seu pai, o conde D. Henrique, participante da Cruzada de Godofredo de Bulhão: "Ficava o filho em tenra mocidade, em quem o pai deixava seu traslado, que do mundo os mais fortes igualava, que de tal pai tal filho se esperava." Há o mesmo provérbio em francês: "Tel père, tel fils" - é repetido em vários outros provérbios. Por exemplo: Quem sai aos seus, não degenera; Filho de peixe, peixinho é; Filho de peixe sabe nadar; Filho de gata, ratos mata, etc. Simões Lopes Neto cita nos "Contos Gauchescos" esta forma: Filho de tigre é pintado.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Fazer lambança

Esta locução, de origem portuguesa, tem vários significados. O primitivo era o de preparar um prato à custa do esforço alheio. O vocábulo lambança, segundo Caldas Aulete, designa coisa que se pode lamber ou comer. Existe, em Portugal provérbio que diz: Muita chança e pouca lambança, isto é, muita vaidade e barriga vazia, ou muita prosa e poucos haveres. Entretanto, no Brasil, adquiriu o sentido de desordem, espalhafato, confusão. É o que se deduz desta passagem das "Memórias", do Visconde de Taunay: "Uma feita, queria um capitão obrigar-me a cortar os cabelos à escovinha. Recorri ao primeiro comandante e fiz-lhe ver que razoavelmente já mandava aparar o que podia parecer estranhável à severidade disciplinar. O capitão lambança (assim o chamávamos pelos hábitos de espalhafato e gritaria) me acompanhara perante o Polidoro." Por seu lado, Raul Pederneiras, em "Geringonça Carioca", registra lambança como sinônimo de trapaça no jogo. Ultimamente, a palavra lambanceiros tem sido usada para caracterizar os pescadores furtivos que invadem os currais de pesca alheios, a fim de se apoderarem dos peixes neles retidos por diligência de terceiros. Está sendo, assim, restituído à locução o primitivo sentido.

sábado, 18 de junho de 2011

Pôr as manguinhas de fora

Tem o mesmo sentido de pôr as unhas de fora, ou revelar, subitamente, intenção abusiva ou imprevista. Rui Barbosa, em artigo em "A Imprensa", em 23/01/1899, condenando violências policiais, escreveu: "Também nunca o arbítrio oficial, aproveitando a complacência dos órgãos da opinião, se mostrou mais resoluto em pôr as manguinhas de fora". José Lins do Rêgo, no romance "Pedra Bonita", escreveu: "O juiz andava botando as manguinhas de fora desmoralizando a justiça". João Ribeiro mostra, em "Frases feitas", que no século XVIII já se usava, em Portugal, expressão semelhante: pôr (ou botar) as mãozinhas (ou as manitas) de fora. Entretanto, procura para tal dito uma explicação aceitável e que inverteria o seu sentido: a de que a expressão teria origem no conto infantil de João e Maria, em que a velha feiticeira mandava que as crianças lhe dessem a apalpar os dedos, para verificar se estavam gordos e bons para as crianças serem devoradas.

Obs.: complacente (tolerante)
         resoluto (afoito, corajoso)

De corpo e alma

É o mesmo que dizer sem nenhuma reserva de atos ou de sentimentos, com dedicação total, com fervor completo. É uma expressão comum a vários povos. Os franceses dizem Corp et âme. Os ingleses, With heart and soul. Os alemães, Mit Leib und Seele. Os espanhóis, En cuerpo y alma.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

O.K. ou Okey

Expressão norte americana de sentido afirmativo. Equivale a dizer que tudo está bem. Segundo alguns filólogos, tal expressão deriva do dialeto dos índios da tribo dos Chotaw, em que a palavra oke - convertida pelos brancos em okey - significa: assim é. Quando o presidente Andrew Jackson, que era sabidamente homem de poucas letras, fazia sua campanha eleitoral, em 1828, seus adversários criaram a versão de que fora ele o criador de O.K., mas como abreviação das palavras all correct, as quais, na sua pobre ortografia, teriam este estranhíssimo aspecto: orl korrect. A sátira fez rir os estados Unidos nessa época. E isso bem demonstra quanto  é antiga a locução, que tem hoje curso internacional.

Obs.: Filólogo: especialista em Filologia.
          Filologia: ciência que estuda a língua, a literatura e a cultura de um povo.

Matar a galinha dos ovos de ouro

Agir com precipitação, imprudência ou impaciência, extinguindo uma fonte de renda constante no afã de extrair resultados imediatos. A expressão é baseada em uma história do folclore europeu sobre uma gansa que, em sua primeira postura, pôs um ovo de ouro. O dono, estúpido e avarento, em vez de esperar novos ovos, matou-a para extrair logo o que havia dentro dela. Nas adaptações para o português, a gansa passou a ser uma galinha, ave mais popular no Brasil. Há muitas variações dessa história, envolvendo vários outros animais. Uma delas é a gansa das penas de ouro, narrada pelos famoso irmãos Jacob e Wilhelm Grimm.

Escapar de boa

É o mesmo que escapar de uma boa cilada, uma boa traição, uma boa manobra armada pelos inimigos. A locução é das mais curiosas, porque, além da forma elíptica, a palavra "boa" nela aparece com um sentido antitético, semelhante ao que tem na expressão uma boa bisca, aplicada às pessoas de má conduta ou péssimo caráter. Em francês há uma expressão equivalente: échapper belle, usada, entre outros por Molière, em uma de suas passagens de "Les Femmes Savantes" (As Sabichonas): "Nous l'avons, en dormant, Madame, échappé belle" (Enquanto dormíamos, senhora, escapamos de boa). Com parte desse verso molieresco, Machado de Assis abriu na "Ilustração Brasileira" a crônica do dia 15/11/1876, sobre boatos de que o General Osório ia chefiar uma revolução republicana: "Nous l'avons échappé belle! Digo isto em francês porque as revoluções são produtos essencialmente franceses e nós escapamos de uma revolução." Circula, em língua portuguesa, um adágio (provérbio) com a mesma forma elíptica daquela locução: Quem de uma escapa, cem anos vive. Uma, no caso, pode ser tanto uma cilada dos homens como do destino ou da morte, através de acidentes, doenças graves, etc.

Obs.: Sentido antitético (Antítese): é uma das mais conhecidas e usadas figuras de linguagem da língua portuguesa que consiste na exposição de ideias opostas.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Amigo da Onça

Ser amigo da onça é ser um amigo hipócrita, inconveniente, maldoso ou desastrado. A expressão nasce da história de um caçador mentiroso, que dizia que, sem armas, fora acuado por enorme onça, de encontro a uma rocha, ao lado da qual não havia uma árvore, em que pudesse subir, nem um pau ou pedra com que pudesse se defender. Contudo, escapara, dando um grito tão grande que a onça fugira em pânico. Uma pessoa presente declarou que isso não poderia ser verdade e que, nas condições descritas, ele teria sido inevitavelmente devorado. Então, veio a pergunta indignada do mentiroso: Afinal, você é meu amigo, ou amigo da onça? Daí partiu o caricaturista Péricles para a criação de um tipo cômico, o Amigo da Onça, popularizado nas páginas de "O Cruzeiro".

Ao Deus dará

Locução surgida de uma resposta tradicionalmente dada pelos homens de coração duro aos que estendiam a mão à caridade pública. Ao rogo: "Uma esmolinha, pelo amor de Deus" - esses espíritos pouco caritativos respondiam invariavelmente "Deus dará", depois transformada em "Deus o favoreça." Os autores portugueses Gomes Monteiro e Costa Leão, em "A Vida Misteriosa das Palavras", dizem que, no século XVII, viveu em Recife um negociante português que, de tanto proferir aquelas duas palavras, teve o seu nome acrescentado para manuel Álvares Deus Dará, com o que não se irritou e, antes, por benefício real, pode usar a alcunha (apelido dado a alguém) como "apelido d' armas". O nome passou aos seus descendentes. Seu filho, Simão Álvares Deus Dará, exerceu o cargo de provedor-mor da Fazenda do Brasil. Estar ao Deus dará é estar na penúria, em desoladora miséria, entregue à sorte, sem nenhuma ajuda terrena e apenas com a problemática proteção celestial.